O Ayurveda, a filosofia médica indiana, separa os tratamentos em 3 dimensões:
1- Yuktivyapasraya: a terapia física que envolve o uso racional dos princípios básicos do Ayurveda, afastar a causa do adoecimento e utilizar a dieta e os medicamentos adequados e individualizados para aquele paciente.
2- Satvavajaya: a terapia mental associa o controle da mente com a ação de evitar objetos e situações que são deletérios à psicologia do paciente.
3- Daivavyapasraya: uma terapia espiritual que envolve uso de mantras, amuletos, pedras preciosas, ritos e oferendas, jejum, devoção, estudo das escrituras, penitências, votos religiosos e peregrinações a lugares considerados sagrados.
A tradição indiana afirma que a nossa mente apresenta 3 qualidades que devem ser compreendidas em um processo de autoconhecimento:
1- Qualidade Sattva: descrição por espiritualidade, sabedoria e introspecção.
2- Qualidade Rajas: descrições por desejos, paixões e apegos.
3- Qualidade Tamas: descrições por inércia, ignorância e embotamento.
No Ayurveda o objetivo da terapia mental (satvavajaya) é gradualmente aumentar a qualidade Sattva e diminuir as qualidades Rajas e Tamas na mente do paciente. Neste contexto o Charaka Samhita (compêndio de clínica médica) recomenda 5 abordagens: Jnana (conhecimento do ser ou autoconhecimento), vijnana (estudo das escrituras), dhairya (correção mental para evitar hábitos e substâncias deletérios que podem levar ao vício), smrti ( registro de fatos experimentados) e samadhi (retirar a mente dos sentidos e traze-la para a concentração total no ser).
Porem o Chandogya Upanishad afirma: “A comida que ingerimos toma três caminhos diferentes: a parte mais grosseira torna-se as excreções, a porção média é transformada na carne (corpo físico) porem a parte mais sutil irá formar a mente”. Com esta colocação, este texto importante, fazemos uma relação direta entre aquilo que ingerimos e a qualidade de nossos pensamentos e emoções. A filosofia indiana aconselha uma alimentação que aumente Sattva (espiritualidade e sabedoria) em nossa mente. A dieta sattvica recomenda os seguintes alimentos: frutas, verduras, legumes, cereais integrais, leite orgânico, ghee, castanhas e mel. Com o objetivo de enganarmos nossa mente e alcançarmos mais profundidade nas práticas de meditação, devemos aumentar esses alimentos em nossa dieta.
Apesar de citar a terapia mental não encontramos o seu aprofundamento nos textos ayurvédicos. A melhor explicação de satvavajaya está no Bhagavad Gita, o principal compêndio do pensamento indiano, no sexto capítulo sobre meditação, quando Arjuna (o discípulo confuso) pergunta a Krishna (o guru perfeito): “pois a mente é inconstante, atormentadora, poderosa, obstinada, ó Krishna! Eu considero o controle dela tão difícil quanto o controle do vento” o Senhor Krishna respondeu: “sem dúvida Arjuna, a mente é inconstante e difícil de ser controlada. Porem Arjuna, através da prática (reprodução) e do desapego, ela é disciplinada”.
Neste mesmo capítulo o senhor Krishna ensina a prática da meditação que disciplina e controla a mente: “Tendo estabelecido o seu assento firme em um local limpo, nem muito alto nem muito baixo…ali sentado neste assento, focando a mente em um ponto e controlando as atividades da mente e dos sentidos devem-se entregar-se ao Yoga (meditação) para a purificação da mente…firme na determinação de fazer meditação, mantendo o tronco, a cabeça e o pescoço em alinhamento, sem movimento, trazendo a atenção para o ponto entre as sobrancelhas (ajna chakra) e com a mente tranquila, livre de medos, firme no voto de brahmacharya (autocontrole sexual), dominando sua mente, com os pensamentos em Mim (o Senhor), o iogue deve sentar-se, tendo a Mim como o objetivo final”. Uma prática introdutória mas eficaz é sentar-se confortavelmente, com a coluna ereta, e observar a respiração, sem controlar, da mesma forma que você observaria a respiração de uma outra pessoa ao seu lado. Apenas um testemunho da entrada e saída de ar pelas narinas, pratique esta técnica 2 vezes ao dia, antes das refeições, ou 2 horas após a comida, manhã e noite por pelo menos 5 a 10 minutos com regularidade.
A tradição indiana traz o conceito de Paramatma, ou seja, o “Guia Interior”. Em sânscrito a alma individual é chamada de Atma, porem Deus como “Guia Interior” é denominado Paramatma ou a “Alma Suprema”. O Katha Upanishad compara a alma individual com a Alma Suprema como dois pássaros sentados nos galhos de uma mesma árvore: a alma individual passa seu tempo degustando, ambas, as frutas doces e amargas da árvore porem a Alma Suprema (Paramatma), sempre satisfeita, permaneça como amiga e testemunha. A Alma Suprema nunca abandona a alma individual, por que a ama profundamente, mas também não interfere nas suas escolhas. Patanjali em seu Yoga Sutra afirma que a meditação neste “Guia Interior”, que é o Guru de todos os professores, leva ao Samadhi (estado de superconsciência).
Os cristãos referem-se a “Alma Superior” ou Paramatma como o Espírito Santo: “…não se preocupem sobre o que dizer ou como dizer…Naquele momento vocês confirmam as palavras corretas, pois, não serão vocês falando mas o Espírito de seu Pai falando através de vocês…” (Matheus 10:20). O Paramatma decide não interferir com nosso livre arbítrio mas este sempre presente, esperando pacientemente, nosso retorno a Ele. Se quisermos ouvir este “Guia Interior”, precisamos fazer escolhas saudáveis ​​e seguir uma prática regular de meditação e prece devocional. Quando acalmamos nossa mente e nossos sentidos, através da repetição da prática, conseguimos sentir Sua presença e alcançarmos o silêncio interior ouviremos a Sua orientação infalível. Terminamos com as palavras do grande mestre Sri Ramakrishna, o Avatar do amor:
“Mergulhe profundamente, ó mente, mergulhe profundamente.
No Oceano da Beleza Divina;
Se você descer as profundezas extremas
Lá, você encontrará a gema do Amor…”
Prof. Aderson Moreira da Rocha, médico de família, reumatologista, especialista em Acupuntura pela Associação Médica Brasileira e especialista em Ayurveda pela Associação Brasileira de Ayurveda. Tel: (21) 25373251. Acesse: www.ayurveda.com.br

 

 

 

Médico de família, reumatologista, acupunturista e especialista em Ayurveda pela Arya Vaidya Phramacy, tradicional escola de Ayurveda do sul da Índia. Mestre e doutor em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da UERJ, presidente da Associação Brasileira de Ayurveda e autor do livro “A Tradição do Ayurveda” pela editora Águia Dourada.
Aderson Moreira Da Rocha